quarta-feira, fevereiro 10, 2010

África, a maior vítima do aquecimento global


A elevação do nível do mar, as secas e as enchentes provocadas pelas mudanças climáticas na África obrigarão o deslocamento de 150 milhões de pessoas até 2050, o que resultará no aumento de guerras e conflitos. Com o aquecimento global, o mundo terá que enfrentar, cada vez mais, grandes desafios humanitários
Todas as noites, de segunda a sábado, o meteorologista Solomon Yohannes apresenta a previsão do tempo no horário nobre da televisão nacional da Etiópia, um dos países mais pobres da África. A audiência é alta, porque o interesse pelo clima está aumentando. Grandes enchentes, como a que assolou o país em 2006, foram previstas pelo apresentador. Ele passou a alertar sobre riscos - algo mais que a temperatura máxima ou mínima ou a chegada de dias chuvosos ou ensolarados. “Fui chamado de mentiroso e questionado por setores do governo que não queriam tomar providências contra catástrofes”, conta Yohannes, certo de que tem pela frente um desafio difícil: “com o aquecimento global e as alterações na temperatura do Atlântico e Pacífico, o clima na África começa a mudar e a população e produtores rurais precisam estar informados sobre os efeitos”. Na Etiópia, com o fim da estação chuvosa por conta das mudanças climáticas, a seca e a escassez de alimentos atingem várias partes do país, afetando 25 milhões dos 75 milhões de etíopes. Só 1% dos cultivos são irrigados. Além do prejuízo econômico, uma vez que a agricultura corresponde a mais da metade da economia e absorve 80% da força de trabalho, o impacto social é grave. Aproximadamente 100 mil crianças sofrem de desnutrição aguda e 20 mil morrem por ano em consequência de diarréia. A má nutrição é problema para quase metade da população. “A luta contra o aquecimento impõe um novo conceito de justiça”, argumenta Walter Fust, diretor do Global Humanitarian Forum (GHF). Ele lamenta: “Até agora, os esforços contra as emissões de carbono não fizeram nada para reduzir a pobreza no mundo”. Os países mais pobres são os menos responsáveis pelos gases do aquecimento global. Mas são os mais vulneráveis aos seus impactos. Na África, estão 15 dos 20 países sob maior risco no mundo. Eles emitem menos que 0,7% do total de carbono lançado na atmosfera do planeta. “Em todos os continentes, as 50 nações menos desenvolvidas representam apenas 1% das emissões e se também os ricos poluíssem tão pouco não haveria mudança climática”, afirma o relatório “A Anatomia de uma Crise Silenciosa”, publicado pelo GHF. O estudo aponta que, hoje, mais de 500 milhões de habitantes estão em situação de risco extremo como resultado do aquecimento global. Seis entre dez pessoas estão vulneráveis a desastres ambientais e impactos socioeconômicos, principalmente nas regiões semi-áridas entre o Deserto do Saara e o Oriente Médio e Ásia Central, bem como nas bacias hidrográficas da África subsaariana, Sul da Ásia e pequenos países-ilha, ameaçados pelo avanço do mar. “É preciso senso de urgência, pois os modelos recentes de previsão climática consideram que os efeitos do aquecimento são mais rápidos e agressivos do que se imaginava”, adverte o relatório. Estima-se que a mudança no clima esteja relacionada a 315 mil mortes por ano -- número superior ao de vítimas fatais no tsunami do ano passado no Oceano Índico. No continente africano, a alteração das chuvas está levando o mosquito transmissor da malária para lugares antes imunes à doença. Além disso, segundo o relatório, o aquecimento é responsável por aumentar em 50 milhões o número de pessoas em situação de fome, além de colocar mais 10 milhões em extrema miséria. Até 2030, o número de famintos deverá crescer dois terços, colocando em risco os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio para reduzir a fome e a pobreza até 2015.

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